sábado, 20 de fevereiro de 2010

Os cães, as gatas e a praia

          Fim de tarde. Fim de mundo. Fim de paciência. Ponho meu tênis e vou-me para a rua. Saio pelo portão. Sinto uma estranha (e falsa) sensação de liberdade. Não posso realmente ir para onde quiser, mas tenho um bom raio de espaço livre a ser vasculhado.

          Decido por andar e aproveitar o momento. Sete da noite, o sol está se pondo. As pessoas aproveitam que a cidade resolveu dar uma aliviada na temperatura. Aparentemente, estávamos sob risco de inundação devido à quantidade de suor produzida diariamente pela população.

          Bem, não estou na capital. Fui arrastado para o limbo. Não que este seja um lugar tão mítico ou importante quanto o limbo; é só que Araruama serve de passagem. É como uma ponte, uma ligação não muito importante.

          Estou a andar sentindo a brisa da lagoa beijar meu rosto. Vou andar a orla toda. Todos os dois quilômetros não me parecem de nada ameaçadores. E quem sabe com uma melhor condição física eu consiga algo com o design.

          Conforme o asfalto vai ficando para trás, começam a aparecer os cães. Das mais variadas formas, eles me acompanham por todo o caminho. Há aqueles que vagueiam sozinhos. Há os de pedigree que nada mais fazem que procurar uma fêmea para procriar. Juro que um deles quase passou por fêmea. Portava uma barrigada tão protuberante que eu pensaria que carregava três filhotes se não fosse por ele, o falo. Balançava inconfundível e imponentemente ao sabor do vento. Macho.

          Começam a aparecer as gatas. Das modelos de saca de ração àquelas que adoram se embrenhar no lixo à procura de um peixinho frito com limão, comparecem aos montes. Algumas carregam os rabos tão alto que se pode ver suas partes, quiçá suas entranhas. Podia jurar que as felinas eram mais metidas que isso. Sempre pensei nelas como cheias de melindres. A verdade é que algumas ganham dos próprios cachorros na questão do relaxamento das maneiras.

          Os cães, como em todo bom desenho, miravam-nas sedentos. Algo em minha mente me lembrou do filme O Rei Leão. Vi um cachorro mostrando ao outro como se esconder e preparar a emboscada para atacar aquela a qual tanto desejava. O que de fato nenhum desses dois sabia é que a presa estava perfeitamente ciente da armadilha. Ela via o caixote e, propositalmente, derrubava o graveto de sustentação e acionava o modo atriz para aparentar surpresa ao ser resgatada daquela prisão pelo bravo cão, ou pelo cão dominador que agora a possuía – vai depender da vontade da freguesa.

          Virando a esquina, encontrei um animal conhecido. É, o mundo é como o número dos leitores desse blog. Esse cão que parado aí estava, montado sobre a gata que lançou-me ameaçador. Bastou um carinho atrás da cabeça – o ponto G dos animais - para que ele voltasse a prestar atenção naquele que tinha debaixo de si.

          Termina a tarde e se põe lindamente no horizonte o balão dourado. Termino toda a orla. Decido refazê-la. Correndo dessa vez. Corri metade apenas. Parei para tentar respirar.

          Parado lá, vi uma estranha reunião de felinas. Pensei no que as faria estar naquele lugar àquela hora. Já começava a escurecer. E lá estavam elas naquele beco cheio de latas de lixo. Abri um sorriso. Esperei quieto e parcialmente escondido; queria vê-las cantar a Jellycle Song for Jellycle Cats. Nada. Deviam ser renegadas. Pfff

          Voltei no ritmo com que comecei. Não lento; o natural para mim. Consegui recuperar o fôlego e voltar a admirar a bicharada. Algumas matilhas passaram por mim. Uma era formada apenas por vira-latas pulguentos locais. Outra, por cães que, com um bom trato, encantariam até as mais exigentes madames.

          Uma em especial chamou minha atenção. Eles andavam tão rapidamente e tão juntos que peguei me perguntando, “Aonde vão?” Eles com certeza estavam de passagem por esta cidade. Tinham todo aquele charme urbano. Andavam em direção à estrada com convicção. Perguntei-me se sabia aonde EU ia.

          Após algum tempo ponderando, cheguei à minha rua. E, conforme voltava para o portão, a única coisa que pude me responder era que nada sabia de minha vida a longo prazo, mas que amanhã eu iria mais uma vez me encontrar com os cães, as gatas e a praia.

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Planta-homem

          A História é muito doida. Juntando todos os fósseis humanos já encontrados, pode-se traçar o caminho que a humanidade fez, a partir da África. Interessante. O continente tido por negro, desconhecido, é na verdade o berço do homem. Ou da mulher, no caso Lucy. Não é fascinante o quanto a História pode ir mudando completamente o mundo apenas com pontos de vistas diferentes?
          Qualquer aluno que receba educação básica já ouviu falar da escala evolutiva humana, passando pelo neandertais, cromagnons, erectus e muitas outras palavras ótimas de se por em uma forca. O pré-adolescente comum sabe saber que a espécie humana atual é Homo Sapiens Sapiens. Bem, será?
          Como muitas coisas na escola, às vezes se pode afirmar algo que será desmentido no futuro. A maturidade intelectual é deveras importante para que se possa compreender que resolver um sistema é, na verdade, achar a interseção entre os conjuntos soluções das duas ou mais equações a serem analisadas. Mas será que o homem chegou ao máximo de sua maturidade intelectual? Entendo esta característica como algo inalcançável, em sua plenitude. O que podemos, no entanto, é termos o máximo possível de vertentes filosóficas.
          Adotemos uma vertente pouco falada hoje em dia: a planta-homem.
          O mundo, a cada revolução industrial, parece assumir colorações mais cinza férrico e vermelho cúprico. Com o desenvolvimento de novas tecnologias e as pesquisas, vem a verdadeira fissão entre o mundo clássico e o atual.
          Antigamente, o homem tinha uma relação com a natureza de “amizade”, em grande parte devido ao politeísmo. Avaliando a crença grega antiga, vê-se vários deuses que representavam o homem e a Terra.
          Hoje em dia, vivemos as consequências da revoluções industriais. O verde está sumindo do mundo. Qualquer aluno do terceiro ano sabe quanto o Aquecimento Global é maciçamente trabalha nos vestibulares e em várias outras áreas. Todo mundo sabe que as plantas estão morrendo. Mas são só elas?
          Uma coisa que não é muito comentada é que o Homo Sapiens Sapiens tem uma característica especial. Ele é uma planta. Como assim uma planta? O homem tem suas raízes no mundo. São elas que nos permitem raciocinar perfeitamente sobre as coisas da vida. Ele tem os braços liberto para interagir com o resto do mundo.
          Essa visão pode levar a conclusões errôneas. Para clarificar uma delas, direi o que realmente mata a planta-homem: ela é uma planta que precisa de muita luz, por isso que toda hora a humanidade tenta chegar mais perto do pleno saber. O que vai pôr em extinção esta espécie é a caverna. Só há sombras neste esconderijo.
          Por que escrevi esta coisa muy lowca? Porque pretendo aqui fazer uma avaliação mental. Como sugere o nome, desisti de raios-X e tomografias da minha cabeça. O que farei é, sem melindres, nem morfinas, fazer uma autópsia em meu cérebro. Talvez ninguém me leia. Talvez o planeta inteiro me leia. O mais importante é que escrever estas coisas me proporciona um crescimento incomensurável. Com esses textos, sinto-me uma planta-homem cada vez mais afastada da caverna.
          Não fechei a quantidade de posts por determinado período de tempo. Deixarei fluir o mais naturalmente possível. Prometo tentar o quanto antes estar incluindo aqui poemas e contos do meu acervo.
          Sem mais delongas, beijinhos.